terça-feira, 3 de novembro de 2009

Foco Narrativo ou Ponto de Vista do Narrador

Foco Narrativo ou Ponto de Vista do Narrador, constitui-se o «ângulo visual» pelo qual serão narrados os acontecimentos de um conto, novela ou romance. É um elemento de especial importância na estrutura de uma narrativa, porque responde à pergunta: Quem conta a história?

Os críticos norte-americanos, Cleanth Brooks e Robert Pen, estabeleceram um quadro sinótico formado por quatro focos narrativos:

1. A personagem principal conta sua história - foco narrativo na primeira pessoa ou interno.

2. Uma personagem secundária conta a história da personagem central - foco narrativo na primeira pessoa ou interno.

3. O Narrador conta a história como observador - foco narrativo na terceira pessoa ou externo.

4. O escritor, analítico ou onisciente (sabedor de tudo), no papel de narrador, conta a história - foco narrativo na terceira pessoa.

Veremos, a seguir, que cada um desses focos trará vantagens e desvantagens ao ficcionista, pois irão favorecer ou limitar seu ângulo visual em ralação ao panorama da história. O escritor terá de optar por um deles. E se sua opção se ajustar à história a ser narrada, é o quanto basta pare ele, ficcionista, e para nós leitores.

a) O Foco Narrativo Será Interno ou na Primeira Pessoa (do singular: eu), se o narrador participa dos acontecimentos da história. É, portanto, um narrador com dupla função, ou seja: é «narrador e personagem» ao mesmo tempo. No geral, ele será protagonista; visto que, como personagem secundário (que conta a história do protagonista), raramente é usado. Sendo protagonista, o narrador recebe melhor destaque. No entanto, a área da narrativa fica circunscrita exclusivamente ao narrador, isto é, um tanto limitada, pois, se trata de sua história.

No trecho abaixo, extraído do conto Missa do Galo, de Machado de Assis, temos um bom exemplo do foco narrativo interno:

“Nunca pude entender a conversação que tive com uma senhora, há muitos anos, contava eu dezessete, ela trinta. Era noite de Natal. Havendo ajustado com um vizinho irmos à missa do galo, preferi não dormir (...).”

Neste parágrafo de abertura do conto, já é possível identificar o foco narrativo que fica evidente pela flexão dos verbos: pude, tive, contava. Além disso, o parágrafo nos permite, também, concluir que o narrador é o protagonista do conto. Temos, portanto, um narrador que nos conta sua história.

Nas narrações em primeira pessoa, o narrador protagonista tem uma visão própria, individual dos fatos. O que implica em uma visão muito reduzida das coisas, porque ele se vê impossibilitado de dispensar às demais personagens a mesma atenção que dispensa a si próprio. A principal característica desse foco narrativo é, então, a visão subjetiva e limitada que o narrador tem dos fatos.

É o caso da personagem-narrador Bentinho, do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis: Capitu, sua mulher, o traiu? Bentinho acredita que sim. Mas nós leitores, não podemos ter certeza disso, uma vez que o fato nos é narrado pelo marido, que se julga traído. Tudo o que sabemos nos chega filtrado pelos sentimentos do Bentinho, incapaz de analisar os fatos com isenção. Por outro lado, esse ângulo de visão, tem suas vantagens. A história ganha, aos olhos do leitor, maior verossimilhança, devido à narrativa não precisar de intermediário: a personagem e narrador que “viveu” a história conta-a diretamente ao leitor; e dá a este a impressão de ser o exclusivo confidente do caso.

b) O Foco Narrativo Será Externo ou na Terceira Pessoa se o narrador somente observou, testemunhou os acontecimentos. Assim, a narrativa será feita por um narrador-observador. Como, ele agora não simula um indivíduo, vê-se compelido a contar apenas o que observou. Não conhece o pensamento, nem o passado das personagens. Não invade o íntimo da personagem para comentar comportamento dela. Exprime uma visão incompleta porque narra à história como mero expectador; seu relato tende a ser mais imparcial e objetivo. Observe:

“Ninguém ali sabia ao certo se a Machona era viúva ou desquitada, os filhos não se pareciam um com os outros. A Das Dores sim afirmavam que fora casada e que largara o marido, para meter-se com um homem do comércio (...)”. (Aluísio de Azevedo, O Cortiço)

Neste fragmento, percebe-se que o narrador-observador desconhece o passado das personagens, baseia-se naquilo que observa e nas afirmações das outras personagens.